Apesar de Shostakovitch ter sido um grande virtuose do piano, sua obra para o instrumento não é grande. Depois de suas experimentações de juventude, dentre as quais se destaca a Sonata nº 1 (1926), direciona-se para a música de câmara e sinfônica, retornando ao piano somente muito mais tarde [com os antológicos 25 Prelúdios e Fugas] . A Sonata nº 1 é próxima da estética de Prokofiev, sendo evidentes as semelhanças com a Sonata nº 3 deste último. Escrita num único movimento, possui várias seções internas, que alternam trechos vigorosos, irônicos, lúgubres e percussivos, com acordes martelados. Trata-se da obra para piano mais original, poderosa e selvagem do autor, de grande dificuldade técnica.
Durante sua vida, Bach foi mais apreciado como virtuose do teclado que como compositor. As Suítes constituem parte significativa de sua obra para cravo. As Seis Suítes Inglesas foram possivelmente as primeiras a serem compostas, a partir de 1715. Apesar do adjetivo no título, devem muito mais aos estilos francês e italiano e à tradição germânica que à música inglesa. O título da coleção na verdade é posterior, e tem sua origem na enigmática observação presente em uma cópia elaborada por Johann Christian Bach: “Feita para os ingleses”. As Suítes Inglesas são mais longas e virtuosísticas que as delicadas Suítes Francesas e menos refinadas que as Partitas. Embora sejam coleções de danças, nunca foram pensadas para serem efetivamente dançadas, apesar de conservarem o ritmo e o espírito da coreografia original.
As Suítes são estruturadas sobre quatro movimentos principais: a “Alemanda”, de origem alemã, séria e elegante, em andamento moderado; a “Corrente”, de procedência francesa ou italiana, mais movida que a anterior; a “Sarabanda”, dança espanhola lenta e grave; e a “Giga”, de origem inglesa, viva e virtuosística. As Suítes Inglesas são iniciadas por um prelúdio de larga escala, que alterna passagens de tutti (mais fortes) e solos (mais suaves). Bach acrescenta ainda um par de danças antes da “Giga”, geralmente mais simples que as demais. No caso da Suíte nº 2, há duas “Bourrées”, dança alegre e graciosa, originária da região francesa da Auvergne.
Em 1830, aos vinte anos, após decidir por uma carreira musical, Schumann foi viver na casa de seu professor, Friedrich Wieck, com o objetivo de se tornar um pianista virtuose. No entanto, uma severa tendinite redirecionou sua carreira para a composição. Em 1834, Wieck recebeu outra aluna, Ernestine von Fricken, por quem Schumann logo se apaixonou. O fervor, que duraria apenas alguns meses, inspirou duas de suas obras mais importantes, o Carnaval, Op.9 e os Estudos Sinfônicos, Op.13.
O pai de Ernestine, o barão Von Fricken, flautista e compositor amador, enviou a Schumann uma obra de sua autoria, em forma de variações. O compositor retomou o tema enviado e começou a escrever suas próprias variações. A primeira versão foi terminada em 1835. O fim do romance abalou também o entusiasmo pela composição, que foi esquecida por quase dois anos. Mas, ao ouvir Chopin executar seus Estudos, Schumann foi tomado de novo ânimo e publicou a peça em 1837, revisando-a em 1852.
O termo “estudo” presente no título se refere aos desafios técnicos impostos ao pianista. Já o adjetivo “sinfônico” remete à variedade de cores e sonoridades, e sobretudo à textura grandiosa, em especial na conclusão.
Ao longo dos Estudos, Schumann utiliza a melodia composta pelo barão de forma extremamente variada e contrastante. A obra é percebida como um todo orgânico desenvolvido numa sequência monumental que culmina numa marcha triunfante, bem mais extensa que os estudos que a antecederam. O movimento final é baseado em um trecho da ópera Os Templários e os Judeus, de Heinrich Marschner, no qual se ouvem as palavras “Inglaterra, alegra-te”. Essa seria uma forma cifrada de homenagear o compositor inglês William Bennett, a quem a obra é dedicada.
EDUARDO MONTEIRO é vice-diretor da Escola de Comunicações e Artes da USP e professor de piano do Departamento de Música.